sábado, 6 de setembro de 2014

Arquivista - protocolista, função que conservou boa parte da História torrense.

Diana de Castro

          No ano de 1948, no governo de Severiano Rodrigues da Silva, Prefeito de Torres em dois mandatos, foi contratado o Sr. Raul Carlos da Silva para a função de “arquivista”, como funcionário público admitido no ano de 1947,  exercendo o cargo de arquivista-protocolista. 

        O senhor Raul Carlos da Silva, no ano seguinte a sua admissão no cargo mencionado, principiou, efetivamente, a ser o responsável direto pela classificação e catalogação dos documentos oriundos da máquina administrativa, ou então, àqueles reconhecidos como tendo uma valorização histórica. Grande parte da herança documental, que hoje usufruído pelos interessados na história torrense, é produto desse período podendo ser encontrado na Casa de Cultura de Torres.
Documento que comprova a admissão de um “arquivista” na Prefeitura Municipal de Torres em 1947.  
Fonte: Arquivo Histórico de Torres, 2008. Livro de Registro de 1945.

segunda-feira, 25 de agosto de 2014

Formação do núcleo urbano e político de Torres: analisados nas correspondências, requerimentos e nos relatos de Saint-Hilaire, datados do inicio do século XIX.

                                                                                                                                         Diana de Castro

  Relembrar os caminhos que uma comunidade percorreu para se organizar em um espaço, é um importante exercício para fortalecer a identidade regional, podendo, de certa forma, ocorrer uma revisão histórica do trajeto percorrido pelo mesmo. Levando em conta a idéia de uma sociedade onde os cidadãos estão estabelecendo uma cultura mais individualista, sendo carimbado com os objetos tecnológicos cada vez mais avançados, podemos vir a temer que os fragmentos importantes da história, possam estar correndo o risco de cair no esquecimento das gerações futuras.
 É com esta elucidação que os documentos do inicio do século XIX, encontrados no Arquivo Histórico do Rio Grande do Sul, sobre a formação do núcleo urbano e político de Torres, se qualifica de grande valia para a realização deste trabalho de analise documental, pois toda a manifestação histórica guarda dentro de si os valores sociais mais onerosos, aproximando todos os integrantes dos grupos humanos, ficando óbvia a relação estreita que estas manifestações travam com valores coletivamente entendidos, tidos como elementos representativos de nossas vivências históricas e culturais, onde os bens considerados patrimoniais, pelo qual fazem parte os registros documentados, seriam os grandes depositários de nossa memória pregressa, e como consequência disso, seriam igualmente alguns dos principais elementos formadores da identidade coletiva de um povo.

[...] as imagens do passado dispostas em ordem cronológica, “ordem das estações” da memória social, evocam e transmitem a recordação dos acontecimentos que merecem ser conservados porque o grupo vê um fator de unificação nos monumentos da sua unidade passada ou, o que é equivalente, porque retêm do seu passado as confirmações da sua unidade presente (LE GOFF, 1992, p. 466)

Com a concepção de memória e identidade colocadas por Jacques Le Goff na obra História e Memória, é que podemos perceber uma necessidade de revisar os elementos históricos do município de Torres, através de estudos documentais, por ser esta uma das unidades administrativas mais antigas do estado do Rio Grande do Sul, neta de Santo Antônio da Patrulha e filha de Conceição do Arroio (atual cidade de Osório), a singela municipalidade, desde o último quarto do século XVIII, recebe como filhos, homens e mulheres vindos das mais longínquas e diferentes latitudes e culturas, onde, atualmente, o município ainda continua recebendo pessoas das mais diferentes regiões, só que a maioria como visitantes, por ser um dos principais escóis turísticos do Rio Grande do Sul, divulgando assim o seu histórico na visão do turismo.

              O ALFERES:PERSONAGEM IMPORTANTE PARA O NASCIMENTO URBANO DE TORRES

  Ruy Rubens Ruschel, personalidade que podemos considerá-lo como um dos primeiros historiadores que organizou vários escritos sobre Torres, como a sua celebre obra Torres Origens, onde, partindo de suas pesquisas sobre os movimentos temporais, podemos seguir pistas até chegarmos ao Arquivo Histórico do Rio Grande do Sul, espaço que além de possuir materiais bem acessíveis sobre a formação territorial torrense, do inicio do século XIX, também esta em sua posse o arquivo particular do Ruschel, contendo anotações transcritas a próprio punho, facilitando na busca dos documentos redigidos pelos funcionários que serviam ao império, como evidenciado neste trecho:

Em 1803 transferia-se para o comando daquela guarda um simples graduado, o sargento Manoel Ferreira Porto, da terceira companhia, o que parece revelar uma diminuição do “status” da guarda. Aliás, ainda em 1809 no Registros das Torres havia só um sargento (o mesmo) e três soldados (7), demonstrada assim a irrelevância a que tinha baixado a guarnição. Porém, ainda se considerava uma “fortaleza”, no dizer de Domingos José Marquês Fernandes, em sua “Descrição Cartográfica”, de 1804 (8) (AHRS, caixa 16- CAD 20).[1]



      
        O mencionado Alferes Manoel Ferreira Porto, filho de pai português e de mãe fluminense (RUSCHEL, 1995), foi designado à região torrense para comandar um pequeno grupo militar, exercendo a função de comandar a realização das cobranças de pedágios no início do século XIX.


 Este Alferes, como todos os filhos de Torres, que além dos poucos pertences materiais que trouxeram consigo, vieram acompanhados de uma herança histórico/cultural muito rica, fazendo parte da formação socioeconômica e urbana torrense, é um personagem muito conhecido pelos curiosos da história do município, por ser considerado um dos responsáveis e fundadores da organização urbana de Torres (homenageado com seu nome em escola e rua), sendo comprovada a sua efetividade em 1814 no “Registro das Torres”, em um documento pertencente ao Arquivo Histórico do Rio Grande do Sul, catalogado como lata 45 /maço 05, onde o alferes transcreve a passagem de uma embarcação pela região, que transportava “quatrocentas arrobas de charques” que vinha do Rio de Janeiro, o dono do barco chamava-se Joaquim José de Souza Guimarães.
 Mas os documentos que o caracteriza como fundador responsável pela urbanização torrense são os que datam de 1815, referente à concessão de uma sesmaria, pertencente à Freguesia da Conceição do Arroio, onde, de acordo com os requerimentos da época de catalogação número 870 / maço 67 / caixa 25, o alferes justifica o seu interesse e recebe léguas de “campos e matos” localizados  entre as “Torres e o Rio Forquilha” , com a autorização do Marquês de Alegrete, governador da província da época, objetivando o povoamento da região, sendo que no mesmo arquivo, no maço 19, encontrasse um requerimento de número 119 de 1816, onde Manoel Ferreira Porto pede autorização para construir uma casa ao lado esquerdo do quartel, pois o mesmo prédio não possuía mais condições de abrigar a sua família:

Dis Manoel Ferreira Porto Alferes reformado e Comandante do Registro das Torres, que lhe suplicante quer edificar no dito Registro huma casa ao lado esquerdo do Quartel para abrigo do sup. e desua numerosa família, que não cabem no Quartel, epor estas também muito danificado a cahir, cujo caso o suplicante quer levantar a seu custo, e como não pode fazer sem licença de N. Esp. por tanto. Porto Alegre 18 de Março de 1816 (AHRS, maço 19 - 119).

 No entanto, a comunidade torrense segue na teoria de que a mencionada casa, construída por Manuel Ferreira Porto, continua de pé, uma teoria defendida também por Ruschel (1995), a casa seria a que está localizada ao lado esquerdo da Igreja Matriz São Domingos, titulada turisticamente como Casa nº 1, que por ser dificultoso achar os documentos, a estimada casa continua não tombada como Patrimônio Histórico no Município, é com estas dificuldades, e com a estrutura da arquitetura, que podemos perceber que a tal edificação pode não ser a casa construída pelo alferes.
  Considerando a obra “A Viagem ao Rio Grande do Sul”, de 1820, do botânico e viajante francês Auguste de Saint-Hilaire, podemos imaginar através das observações transparecidas nas suas palavras, como era a região naquele período, pois ele delineia sua aventureira passagem por Torres, onde, além de descrever sobre as incríveis paisagens naturais, relata também sobre as poucas e simples moradias pelo qual visitava e o inicio da construção de uma igreja, possivelmente a atual Igreja Matriz São Domingos, e de um forte que estava sendo edificado por mãos de 30 prisioneiros, pelo qual 29 eram índios, uns vieram das Missões e outros do Paraguai, mas todos conheciam a língua espanhola. Tais instalações são apontadas neste trecho:

Como há o projeto de localizar-se em Torres a sede de uma paróquia iniciaram aí a construção de uma igreja, da qual apenas existe o madeiramento. Após passarmos por essa igreja chegamos a um forte cuja construção se última e junto ao qual se acha o alojamento dos soldados do posto e do alferes que os comanda. Tais edificações ficam na face ocidental do monte, local de onde gozei um panorama que me pareceu mais encantador do que realmente era, devido à monotonia dos areais áridos a que meus olhos se acostumaram nos dias anteriores (SAINT-HILAIRE, 1820, p. 24).

 Ainda em uma inscrição interna da Igreja, que teve seu inicio como Capela, informa sua inauguração datada em 24/10/1824, mas como acontecia com qualquer comunidade daquele período, em que prevalecia a religião católica como centro sociocultural, já na organização significativa da tal Capela, moradores começaram a edificar casas aos redores do que é atualmente a Igreja Matriz São Domingos (tombada pelo IPHAN em 1983 e esta no processo de restauração), não mais precisando se deslocarem para Conceição do Arroio (atual Osório), para cumprirem suas obrigações religiosas. Com o tempo, a Igreja passou a se responsabilizar também pela organização das listas de recenseamento dos moradores (incluindo os escravos) e de eleitores (em 1828 o Governo Imperial baixou o regimento das Câmaras Municipais, assim possibilitando a primeira eleição de Juiz de Paz no já Distrito das Torres), sendo assim, a Capela pode ser considerado um dos primeiros núcleos organizadores da administração urbana, fato podendo ser analisado nos documentos pertencentes à catalogação AR 11/maço 23/ 1.47 de São Domingos das Torres no Arquivo Histórico.
Analisando os documentos mencionados, que dão referencias ao período de urbanização torrense, podemos constatar que no inicio do século XIX, o atual município era apenas um local militar para cobrança do pedágio imperial, que por ter em seu comando um Alferes que se portava com extrema simpatia para com os que passavam pela antes chamada Guarda da Torres, cedendo sua própria moradia como hospedagem, como é caracterizada nestas palavras:

Chegado à residência do Alferes mostrei-lhe meus documentos, sendo muito bem recebido e alojado em uma pequena casa, onde ficarei sozinho e de onde se avista o lago(SAINT-HILAIRE, 1820, p. 24).

              A relatada residência, no que aparentava pelas descrições documentadas pelo Saint-Hilaire, era a única moradia devidamente organizada, e propicia para hospedar os visitantes de importante nível político da província e do império católico, estabelecendo assim um melhor contato entre o local e aqueles que poderiam divulgar as necessidades da minúscula comunidade, talvez uma estratégia do Ferreira Porto, visando impulsionar o desenvolvimento da mesma e assim de melhorar a vida dos habitantes que ali residiam, sem muito prosperar em suas precárias moradias, como se refere o botânico:

A palhoça é construída de paús aramados em grade e forradas de folhas de palmeiras, que também entram na coberta da casa.  Esta se compõe de dois compartimentos apenas- um pequeno paiol sem portas e um quarto sem janelas e sem mobiliário, onde as roupas e utensílios de toda a família são estendidos sobre esteios (SAINT-HILAIRE, 1820, p. 27).

 No mesmo diário onde encontrasse este trecho, em 11 de junho de 1820, Saint -Hilaire ainda relata uma primeira tentativa do império de povoar Torres, quando encontra pelo caminho, na passagem por Tramandaí, um grupo de índios prisioneiros vindo das Missões (seres largados nas mãos de soldados após a saída dos jesuítas), enviados pelo governador da Capitânia de Rio Grande, Conde da Figueira, para a região, com o intuito de organizar uma aldeia, pois os índios não eram considerados nocivos, e o império precisavam de braços para construir e formar o Estado. Sendo que o Botânico francês, já havia relatado outro grupo de guaranis que estavam trabalhando na construção do forte em Torres, índios que haviam sido capturados durante a batalha de Taquarembó, quando o General José Artigas foi batido pelo Conde da Figueira, e ainda constam correspondências datadas de 1824, que trinta soldados Guaranis foram enviados para reforçar a Guarda das Torres, onde mesmo sendo um grupo de grande ajuda na construção das primeiras estradas, foi motivo na produção de requerimentos (RUSCHEL, 1995) onde os temas eram de reclamações pelas fugas dos mesmos para Porto Alegre.
  
 Ainda tendo como referencia as habilidades receptivas do Alferes, podemos deduzir que foi com este carisma que D. José Caetano da Silva Coutinho interferiu na urbanização de Torres, quando esteve na região em 1815 sendo bem recebido pela família do Alferes, autorizando o mesmo a edificar a já mencionada Capela, ao lado de sua moradia, para atender os poucos moradores do local, que na sua maioria era rural, consequentemente no mesmo ano Porto recebeu a concessão de “meia légua em quadro de terras” (sesmaria), alimentando a idéia do funcionamento estratégico do gentil Alferes, objetivando o desenvolvimento daquele pequeno grupo social de diversidade étnico. 
           
           TEN. CEL. SOARES: UM MILITAR DE VISÃO, COM COMANDO ADMINISTRATIVO

 Com a independência do Brasil, a Guarda das Torres passou a se chamar de Presídio das Torres, nomenclatura aplicada a uma guarnição fortificada da fronteira, e em 1824 nova denominação foi acrescentada ao povoado: Baluarte Ipiranga, tendo no comando o Tenente Francisco de Paula Soares, paulista na patente desde 1821 permanecendo no comando de Torres até 1930 (sua postura de coragem visionaria o levou a uma promoção de coronel em 1831), como podemos constatar nos documentos catalogados como lata 181 e 182 / maço 4 e 3 pertencentes ao  Arquivo Histórico do Rio Grande do Sul, analisando-se também que mesmo afastado da função, Manoel Ferreira Porto ainda opinava na guarnição, quando oportunizado, assinando como Alferes Reformado.
  E mesmo não tendo tanto reconhecimento pela população, em alguns documentos é bem perceptível a importância que o Ten. Cel. Soares teve na estruturação urbana torrense, pois o mesmo foi responsável pela primeira organização administrativa no controle econômico, desempenhando o papel de administrador distrital articulando a construção de estradas, incentivando também a produção (cachaça, farinha de mandioca, milho e banana) e o povoamento por colonizadores estruturando a urbanização, que mesmo não mais residindo em Torres, continuava pedindo pelo povoado através de cartas enviadas para o governo da província.
  Este nobre Comandante foi um militar que acompanhava as mudanças políticas provinciais e mantinha certa dosagem do apoio dos componentes responsáveis pelo catolicismo regional, conquistando aos poucos seu espaço como o cabeça planejador, estruturando o caminho do desenvolvimento torrense, movimentando a pacata comunidade colocando-os como parcela nos acontecimentos gaúchos, como dissertado:

O Comandante Soares, “oficial” referido na carta, procurou o tal espaço e chegou à conclusão de que o melhor seria colocar os imigrantes em terras devolutas que estavam a descobrir nas margens do Rio Mampituba, ao longo da estrada de penetração que aí construía. Essa proposta foi encaminhada ao Governador Pinheiro em carta datada de “Piranga” (isto é: Baluarte Ipiranga), 01-04-1825: “Lembramos agora dizer a V. exercia que neste distrito há infinidade de terras devolutas e que melhor e mais vantajoso para este lugar se se estabelecesse uma colônia nas vizinhanças da nova estrada para Vacaria. Alí há terras para toda sorte de lavouras, para cana as de barro, para mandioca as de areia, para arroz e linho as terras baixas, para algodão e mantimentos as altas. Matos, os milhares, tudo isto com navegação para aqui.” Na mesma carta explicava que a primeira etapa da estrada vinha sendo aberta até onde o Mampituba era navegável; ali seria erguido um Quartel- Paliçada, que em cartas posteriores explicou chamar-se Forte da Glória e destinar-se a servir de centro da colônia alemã.  O nome foi atribuído por sugestão do Presidente Feliciano como homenagem à princesa Maria da Glória, filha mais velha de D. Pedro I, como se vê em apontamento de próprio punho na margem de outra carta que recebeu o Comandante Soares no mesmo mês (RUSCHEL, p. 58-59).

Ainda considerando algumas correspondências enviadas ao presidente da província, também é possível perceber as dificuldades que o Ten. Cel. Soares, e a pequena população, passaram no inicio da construção urbana torrense, onde é visível a preocupação do mesmo com a falta de alimentos, pedindo assim, em suas cartas, que fossem enviados necessitados suplementos para o carente grupo que residiam na região torrense, e estava sob seu comando.
Para aumentar ainda mais as dificuldades, em 1824 ouve um surto de difteria na região que, segundo o próprio comandante, ocorreu devido aos terrenos pantanosos e as chuvas incessantes daquele período, vindo a óbito mais de 20 pessoas naquele ano, sendo considerado um número grande devido à quantidade de habitantes do local. Para acabar com esta epidemia, o comandante pediu a vinda urgente de remédios (botica) ao governo provincial, restabelecendo assim a população acabando com os óbitos por este surto, podendo assim receber, com mais tranquilidade, cerca de 400 imigrantes alemães, divididos entre católicos e protestantes, que chegaram a Torres em 1826, onde os católicos, em menor número, fixaram-se e permaneceram próximos a Capela de São Domingos e os protestantes, que estavam bem assistidos, pois além do pastor assessorar na parte espiritual também era médico e responsável pela alfabetização deste grupo germânico, organizaram-se no espaço onde é atualmente o município de Dom Pedro de Alcântara.
 Toda essa transformação ocorreu porque o Tem. Cel. Soares foi convocado pelo Presidente da Província, o Brig. José Egídio da Barbuda, para assumir a responsabilidade de implantar na região torrense a Colônia Alemã (projeto imperial de imigração desde 1824), tendo que assumir o encargo em quatro de setembro de 1826, como Inspetor da Colônia de Torres, e toda essa organização pode ser observado em alguns trechos das cartas escritas pelo comandante Soares:

Os collonos protestantes, como não precisavam serem [sic] socorridos pelo cura de Tôrres, os colloquei [sic] com o seu pastor e médico, 8 léguas mais ou menos distantes da Povuação [sic] ou prezídio das pingues margens do Rio Três Forquilhas em duas linhas parallelas [sic]: Os collonos [sic] arranxados [sic]mui bem acomodados pela vantagem que gozão [sic] da Navegação deste rio (SOARES, 1826, apud SILVA, 1985,p.42).

 Em 20 de dezembro de 1837, com a Lei Provincial n° 13, Torres foi promovido a Freguesia de São Domingos das Torres (RUSCHEL, 1995), no momento considerado delicado, em que a província tinha dois governos devido a Revolução Farroupilha (Bento Gonçalves do lado farroupilha e Antônio Elzeário de Miranda e Brito do Império), sendo que Torres havia passado pelas mãos dos farrapos e dos legalistas mais de uma vez, tendo a necessidade de neutralizar concordâncias da comunidade local pela causa da revolução. Com esta intenção neutralizante, o governo provincial resolveu cumprir uma promessa feita na administração do Ten. Cel. Francisco de Paula Soares, objetivando premiar o desenvolvimento comunitário, onde, mesmo a palavra Freguesia significando Filho da Igreja em latim, a simpática comunidade passou a ser menos eclesiástico, consolidando o setor eleitoral, judiciário e administrativo.
 Também com a aplicação desta Lei, a Igreja de São Domingos deixou de ser uma simples Capela Filial (ligada à Matriz Conceição de Nossa Senhora em Osório) a Matriz, independente e subordinada diretamente ao Bispo. Com todas essa mudanças, Torres passou a ser sede da assembléia paroquial, que era o conjunto de eleitores primários, que se reuniam para eleger eleitores provinciais, que por sua vez, escolhiam os senadores e deputados, isto é, promovido Freguesia passou a ser uma molécula eleitoral de todo sistema, subordinada a Santo Antônio da Patrulha até 1857, sendo vista como um caminho para uma emancipação, que só seria conquistada em 21 de maio de 1878: Município de São Domingos das Torres.





Por meio das já referidas analises, podemos constatar que o município de Torres teve dois grandes interessados pela sua formação urbana, o alferes Manuel Ferreira Porto e o comandante Francisco de Paula Soares, articulando uma trajetória em prol do desenvolvimento socioeconômico, e até podemos dizer arquitetônico, da região, cada qual com a sua maneira, estabelecendo importantes contatos com respeitáveis personalidades da província na época, saindo do mero espaço estratégico e alfandegário de controle militar, desafiando e conquistando as etapas do caminho urbanizador, que teve inicio com a construção da moradia do alferes em 1816, consecutivamente a capela que evoluiu para a atual Igreja Matriz, inaugurada em 1824, motivando moradores rurais e imigrantes alemães e açorianos a construírem casas aos redores da edificação religiosas.
  Todas essas movimentações oportunizaram maiores solicitações, como a abertura de estradas, facilitando o acesso objetivando o aumento populacional, exigindo assim uma organização administrativa mais independente da província, onde os herdeiros do Ferreira Porto exerceram importantes funções como membros das primeiras comissões da Câmara Municipal de São Domingos das Torres, como o Antônio Ferreira Porto, que fora Fiscal da Câmara em 1847, ao lado do seu irmão Caetano Ferreira Porto, que era o seu suplente, estes dados e de outros cidadãos estão presentes no livro Ata aberto em junho 1847, que atualmente faz parte do acervo documental do Museu Caldas Júnior, em Santo Antônio da Patrulha.

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[1] Manuscrito catalogado no Arquivo particular do Ruschel, atualmente pertence ao Arquivo Histórico do Rio Grande do Sul, onde de acordo com suas anotações o número 8 do trecho requeresse a descrição cartográfica do sargento Mor Domingos José Marques Ferreira de 1804, publicado em separata de Pesquisas-História nº 15 do Instituto Anchietano de pesquisas, São Leopoldo, 1961,p. 15.




REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BATISTA, Jaime Luis da Silveira. Sob as lentes de Torres. Torres: Lorigraf, 2012.

LE GOFF, Jacques. História e Memória. 4 ed. São Paulo: Editora da Unicamp, 1996.

RUSCHEL, Ruy Rubem. Torres Origem. Torres: Gazeta, 1995.

SAINT- HILAIRE, Auguste de. Viagem ao Rio Grande do Sul (1820-1821). Porto Alegre: Martins, 1987.

SILVA, Marina Raymundo. Navegação Lacustre Osório – Torres. Porto Alegre: Jollo, 1985.